(FAPESP) A crise energética e a busca por energias renováveis têm reacendido o debate sobre fontes alternativas como a fotovoltaica, na qual células solares convertem luz diretamente em eletricidade. Mas no Brasil, país que pela área, geografia e localização, entre outros fatores, é potencialmente favorável para o desenvolvimento de sistemas fotovoltaicos, existe um atraso em relação a outros países.
Esse foi um dos diagnósticos apresentados durante o Workshop em Energia Fotovoltaica, realizado na semana passada na sede da FAPESP. O objetivo do evento foi reunir especialistas para discutir desafios científicos e tecnológicos de curto, médio e longo prazos no setor, além de expor o panorama mundial de desenvolvimento da pesquisa e inovação, recursos e lacunas existentes nas universidades e centros de pesquisa no Estado de São Paulo.
De acordo com Cylon Gonçalves da Silva, professor emérito do Instituto de Física da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e coordenador adjunto da FAPESP para Programas Especiais, o objetivo maior do workshop foi fazer uma prospecção do que já existe no Estado de São Paulo em pesquisa e desenvolvimento na área de eletricidade fotovoltaica.
“A partir disso, pretendemos avaliar se caberia ou não à FAPESP a criação de um programa específico nessa área. Como todo programa específico da Fundação, será necessário demonstrar não apenas sua relevância técnico-científica, mas também o diferencial de contribuição para o desenvolvimento de São Paulo que ele pode propiciar”, disse à Agência FAPESP.
Os participantes, ligados a grupos de pesquisa no Estado de São Paulo, apresentaram diversos aspectos relacionados ao tema. As palestras abordaram, em linhas gerais, o desenvolvimento de células solares e de módulos fotovoltaicos, a necessidade de se produzir silício de alta pureza (o chamado silício de grau solar), a reativação dos laboratórios e a necessidade de uma política nacional na área para viabilizar a produção em larga escala, entre outros aspectos.
A energia solar fotovoltaica é a forma de produção de eletricidade que mais cresce no mundo atualmente. Segundo estudos do Instituto de Energia da Universidade da Califórnia e da Associação das Indústrias Fotovoltaicas Europeias, desde 2003 o índice de expansão dessa indústria ultrapassa 50% ao ano.
Para o professor Francisco Marques, do Instituto de Física da Unicamp, que apresentou o panorama da pesquisa fotovoltaica no mundo, esse índice extraordinário só foi possível devido à integração dos sistemas fotovoltaicos integrados à rede pública convencional de energia.
“Como é uma energia intermitente, acoplada à rede, não há necessidade de baterias para armazenamento. O Brasil tem tido um crescimento muito lento em aplicações isoladas. Para ter uma expansão acelerada – como a que vem ocorrendo em vários países da Europa –, terá de desenvolver sistemas integrados à rede elétrica”, afirmou.
Roberto Zilles, professor do Instituto de Eletrotécnica e Energia da Universidade de São Paulo (USP), abordou os sistemas periféricos de armazenamento das energias fotovoltaicas e destacou a reduzida produção nacional por esse sistema.
“Temos apenas cerca de 20 MW de capacidade instalada para geração de energia fotovoltaica em sistemas isolados, que são empregados em bombeamentos de água e eletrificação rural, em áreas na Amazônia, no Norte e no Nordeste”, disse. Esse valor daria, por exemplo, para o consumo de uma pequena cidade com cerca de 2 mil a 3 mil habitantes.
Segundo Zilles, a iniciativa com sistemas isolados está contemplada na resolução 83 da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), de 2004, que estabelece os procedimentos e as condições de fornecimento de sistemas individuais de geração de energia elétrica com fontes intermitentes, que contempla as fontes solar, eólica, biomassa e pequenas centrais hidrelétricas.
Custo energético
“A raiz do problema que emperra a expansão brasileira na área esbarra na produção do silício. As células mais importantes e consolidadas no mercado são as fabricadas à base de silício”, disse Henrique Toma, professor do Laboratório de Nanotecnologia Molecular da USP, que apresentou estudos desenvolvidos sobre síntese de novas moléculas e de fotossíntese artificial, uma área ainda em desenvolvimento no país.
Depois do oxigênio, o silício é o elemento químico mais abundante na crosta terrestre. Para o professor Paulo Roberto Mei, do Departamento de Engenharia de Materiais, da Unicamp, não faz sentido investir em um produto em que se tem perdido mercado, no caso o silício metalúrgico. O Brasil exporta essa forma impura do mineral a US$ 2 o quilo, enquanto importa o silício de alta pureza, para uso na indústria eletrônica, a US$ 60 o quilo.
“Vendemos a forma impura, que é muito fácil de fazer e não usa praticamente nenhuma tecnologia. Mas o problema é que, para isso, gasta-se muita energia, além de produzir muito material particulado, que polui o meio ambiente. No Brasil, temos uma legislação rigorosa que obriga a usar filtros muito eficientes, o que é muito bom. Mas, resumindo, o processo é caro e a venda não é lucrativa”, explicou.
Segundo ele, o país vem perdendo espaço para a China e para a Índia nessa produção. “Eles conseguem produzir o mesmo silício metalúrgico com um custo menor. A China detinha 25% do mercado mundial há alguns anos e hoje tem quase 70%. Indústrias brasileiras têm sido compradas por empresas norte-americanas para transformar o silício metalúrgico em silício de alta pureza. Do ponto de vista estratégico para o país, isso é um desastre”, disse Mei.
O professor da Unicamp destaca que o silício poderia ser usado não apenas para a produção de energia fotovoltaica, mas na indústria de microeletrônica, isto é, de semicondutores.
Outra discussão importante no workshop foi o custo energético. Entre todas as formas de energia limpa, a fotovoltaica ainda é a mais cara. “Em uma análise apenas econômica, talvez se conclua que importar é mais fácil, por ser mais barato. Mas existem outros aspectos. Quando os norte-americanos levaram o homem à Lua, pode não ter significado muito do ponto de vista econômico em um primeiro momento, mas gerou um parque industrial incrível”, disse Mei.
Mas a discussão política na área de fotovoltaicos parece caminhar na direção da importação. Já está em curso no Senado o projeto de número 336/2009 que isenta do imposto de importação, que é de 12%, as empresas estrangeiras que fornecerem células fotovoltaicas, módulos em painéis e seus periféricos.
Pelo projeto proposto, todos os estádios da Copa de 2014, que será no Brasil, utilizariam energia fotovoltaica. De acordo com Roberto Zilles, o projeto, que tem apenas um parágrafo, tem grandes chances de aprovação.
“Mas, se o objetivo é incentivar o desenvolvimento de tecnologia fotovoltaica – seja a produção de células ou de elementos periféricos –, isentar de impostos os produtos prontos tira a perspectiva em relação à pesquisa, desenvolvimento e inovação nessa área no país”, disse.
Geração potencial
No campo do desenvolvimento de células fotovoltaicas, o Brasil tem acompanhado as pesquisas de ponta internacionais, mas ainda em nível experimental. De acordo com Ana Flávia Nogueira, do Instituto de Química da Unicamp, atualmente o Laboratório de Nanotecnologia e Energia Solar (LNES) da Unicamp já desenvolve células com materiais nanoestruturados, as chamadas células de terceira geração.
“A grande vantagem é que o custo desses materiais é baixo. Já conseguimos utilizar em aplicações menores, como em mochilas solares, utilizadas para carregar baterias de notebooks, por exemplo”, disse no workshop na FAPESP.
O problema, segundo ela, é que a eficiência energética da conversão da energia da radiação solar em energia elétrica ainda não é satisfatória, girando em torno de 6,5%. Atualmente, a média mundial de eficiência é de 14% e as melhores células no mercado não ultrapassam os 20%.
As células da primeira geração utilizavam o silício monocristalino. As de segunda, os filmes finos e, atualmente, as da terceira geração empregam células fotovoltaicas orgânicas ou células fotovoltaicas híbridas orgânicas/inorgânicas.
“Os dispositivos fotovoltaicos baseados em silício monocristalino representam uma tecnologia completamente dominada e que apresenta elevado índice de conversão de energia solar em elétrica. Mas o custo de produção e de manutenção torna inviável seu uso em larga escala”, disse Roberto Mendonça Faria, do Instituto de Física de São Carlos da USP.
Segundo ele, a tecnologia produzida a partir dos semicondutores amorfos e de óxidos, na forma de filmes finos (segunda geração), vem se mostrando viável do ponto de vista econômico. Mas o destaque está mesmo na terceira geração.
“A nova geração de tecnologia dos dispositivos orgânicos é de fácil processamento, baixo custo de fabricação e muito versátil. Eles ainda não apresentaram eficiências energéticas aceitáveis, mas as pesquisas vêm se desenvolvendo rapidamente. É preciso um mecanismo para coordenar os vários grupos de pesquisa no Brasil a fim de viabilizar a fabricação desses dispositivos para torná-los mais eficientes na aplicação”, defendeu.
Nos encaminhamentos do workshop, os participantes se dividiram em três grupos de trabalho. Cada um elaborará um documento com a análise dos principais aspectos discutidos no workshop, focados principalmente nas três gerações de células solares. O objetivo é que, a partir dos documentos, seja realizado um novo encontro.
Esse foi um dos diagnósticos apresentados durante o Workshop em Energia Fotovoltaica, realizado na semana passada na sede da FAPESP. O objetivo do evento foi reunir especialistas para discutir desafios científicos e tecnológicos de curto, médio e longo prazos no setor, além de expor o panorama mundial de desenvolvimento da pesquisa e inovação, recursos e lacunas existentes nas universidades e centros de pesquisa no Estado de São Paulo.
De acordo com Cylon Gonçalves da Silva, professor emérito do Instituto de Física da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e coordenador adjunto da FAPESP para Programas Especiais, o objetivo maior do workshop foi fazer uma prospecção do que já existe no Estado de São Paulo em pesquisa e desenvolvimento na área de eletricidade fotovoltaica.
“A partir disso, pretendemos avaliar se caberia ou não à FAPESP a criação de um programa específico nessa área. Como todo programa específico da Fundação, será necessário demonstrar não apenas sua relevância técnico-científica, mas também o diferencial de contribuição para o desenvolvimento de São Paulo que ele pode propiciar”, disse à Agência FAPESP.
Os participantes, ligados a grupos de pesquisa no Estado de São Paulo, apresentaram diversos aspectos relacionados ao tema. As palestras abordaram, em linhas gerais, o desenvolvimento de células solares e de módulos fotovoltaicos, a necessidade de se produzir silício de alta pureza (o chamado silício de grau solar), a reativação dos laboratórios e a necessidade de uma política nacional na área para viabilizar a produção em larga escala, entre outros aspectos.
A energia solar fotovoltaica é a forma de produção de eletricidade que mais cresce no mundo atualmente. Segundo estudos do Instituto de Energia da Universidade da Califórnia e da Associação das Indústrias Fotovoltaicas Europeias, desde 2003 o índice de expansão dessa indústria ultrapassa 50% ao ano.
Para o professor Francisco Marques, do Instituto de Física da Unicamp, que apresentou o panorama da pesquisa fotovoltaica no mundo, esse índice extraordinário só foi possível devido à integração dos sistemas fotovoltaicos integrados à rede pública convencional de energia.
“Como é uma energia intermitente, acoplada à rede, não há necessidade de baterias para armazenamento. O Brasil tem tido um crescimento muito lento em aplicações isoladas. Para ter uma expansão acelerada – como a que vem ocorrendo em vários países da Europa –, terá de desenvolver sistemas integrados à rede elétrica”, afirmou.
Roberto Zilles, professor do Instituto de Eletrotécnica e Energia da Universidade de São Paulo (USP), abordou os sistemas periféricos de armazenamento das energias fotovoltaicas e destacou a reduzida produção nacional por esse sistema.
“Temos apenas cerca de 20 MW de capacidade instalada para geração de energia fotovoltaica em sistemas isolados, que são empregados em bombeamentos de água e eletrificação rural, em áreas na Amazônia, no Norte e no Nordeste”, disse. Esse valor daria, por exemplo, para o consumo de uma pequena cidade com cerca de 2 mil a 3 mil habitantes.
Segundo Zilles, a iniciativa com sistemas isolados está contemplada na resolução 83 da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), de 2004, que estabelece os procedimentos e as condições de fornecimento de sistemas individuais de geração de energia elétrica com fontes intermitentes, que contempla as fontes solar, eólica, biomassa e pequenas centrais hidrelétricas.
Custo energético
“A raiz do problema que emperra a expansão brasileira na área esbarra na produção do silício. As células mais importantes e consolidadas no mercado são as fabricadas à base de silício”, disse Henrique Toma, professor do Laboratório de Nanotecnologia Molecular da USP, que apresentou estudos desenvolvidos sobre síntese de novas moléculas e de fotossíntese artificial, uma área ainda em desenvolvimento no país.
Depois do oxigênio, o silício é o elemento químico mais abundante na crosta terrestre. Para o professor Paulo Roberto Mei, do Departamento de Engenharia de Materiais, da Unicamp, não faz sentido investir em um produto em que se tem perdido mercado, no caso o silício metalúrgico. O Brasil exporta essa forma impura do mineral a US$ 2 o quilo, enquanto importa o silício de alta pureza, para uso na indústria eletrônica, a US$ 60 o quilo.
“Vendemos a forma impura, que é muito fácil de fazer e não usa praticamente nenhuma tecnologia. Mas o problema é que, para isso, gasta-se muita energia, além de produzir muito material particulado, que polui o meio ambiente. No Brasil, temos uma legislação rigorosa que obriga a usar filtros muito eficientes, o que é muito bom. Mas, resumindo, o processo é caro e a venda não é lucrativa”, explicou.
Segundo ele, o país vem perdendo espaço para a China e para a Índia nessa produção. “Eles conseguem produzir o mesmo silício metalúrgico com um custo menor. A China detinha 25% do mercado mundial há alguns anos e hoje tem quase 70%. Indústrias brasileiras têm sido compradas por empresas norte-americanas para transformar o silício metalúrgico em silício de alta pureza. Do ponto de vista estratégico para o país, isso é um desastre”, disse Mei.
O professor da Unicamp destaca que o silício poderia ser usado não apenas para a produção de energia fotovoltaica, mas na indústria de microeletrônica, isto é, de semicondutores.
Outra discussão importante no workshop foi o custo energético. Entre todas as formas de energia limpa, a fotovoltaica ainda é a mais cara. “Em uma análise apenas econômica, talvez se conclua que importar é mais fácil, por ser mais barato. Mas existem outros aspectos. Quando os norte-americanos levaram o homem à Lua, pode não ter significado muito do ponto de vista econômico em um primeiro momento, mas gerou um parque industrial incrível”, disse Mei.
Mas a discussão política na área de fotovoltaicos parece caminhar na direção da importação. Já está em curso no Senado o projeto de número 336/2009 que isenta do imposto de importação, que é de 12%, as empresas estrangeiras que fornecerem células fotovoltaicas, módulos em painéis e seus periféricos.
Pelo projeto proposto, todos os estádios da Copa de 2014, que será no Brasil, utilizariam energia fotovoltaica. De acordo com Roberto Zilles, o projeto, que tem apenas um parágrafo, tem grandes chances de aprovação.
“Mas, se o objetivo é incentivar o desenvolvimento de tecnologia fotovoltaica – seja a produção de células ou de elementos periféricos –, isentar de impostos os produtos prontos tira a perspectiva em relação à pesquisa, desenvolvimento e inovação nessa área no país”, disse.
Geração potencial
No campo do desenvolvimento de células fotovoltaicas, o Brasil tem acompanhado as pesquisas de ponta internacionais, mas ainda em nível experimental. De acordo com Ana Flávia Nogueira, do Instituto de Química da Unicamp, atualmente o Laboratório de Nanotecnologia e Energia Solar (LNES) da Unicamp já desenvolve células com materiais nanoestruturados, as chamadas células de terceira geração.
“A grande vantagem é que o custo desses materiais é baixo. Já conseguimos utilizar em aplicações menores, como em mochilas solares, utilizadas para carregar baterias de notebooks, por exemplo”, disse no workshop na FAPESP.
O problema, segundo ela, é que a eficiência energética da conversão da energia da radiação solar em energia elétrica ainda não é satisfatória, girando em torno de 6,5%. Atualmente, a média mundial de eficiência é de 14% e as melhores células no mercado não ultrapassam os 20%.
As células da primeira geração utilizavam o silício monocristalino. As de segunda, os filmes finos e, atualmente, as da terceira geração empregam células fotovoltaicas orgânicas ou células fotovoltaicas híbridas orgânicas/inorgânicas.
“Os dispositivos fotovoltaicos baseados em silício monocristalino representam uma tecnologia completamente dominada e que apresenta elevado índice de conversão de energia solar em elétrica. Mas o custo de produção e de manutenção torna inviável seu uso em larga escala”, disse Roberto Mendonça Faria, do Instituto de Física de São Carlos da USP.
Segundo ele, a tecnologia produzida a partir dos semicondutores amorfos e de óxidos, na forma de filmes finos (segunda geração), vem se mostrando viável do ponto de vista econômico. Mas o destaque está mesmo na terceira geração.
“A nova geração de tecnologia dos dispositivos orgânicos é de fácil processamento, baixo custo de fabricação e muito versátil. Eles ainda não apresentaram eficiências energéticas aceitáveis, mas as pesquisas vêm se desenvolvendo rapidamente. É preciso um mecanismo para coordenar os vários grupos de pesquisa no Brasil a fim de viabilizar a fabricação desses dispositivos para torná-los mais eficientes na aplicação”, defendeu.
Nos encaminhamentos do workshop, os participantes se dividiram em três grupos de trabalho. Cada um elaborará um documento com a análise dos principais aspectos discutidos no workshop, focados principalmente nas três gerações de células solares. O objetivo é que, a partir dos documentos, seja realizado um novo encontro.
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