segunda-feira, 23 de março de 2009

Meteoritos podem ter ajudado a gerar vida

Calor, pressão e carbono formado pelo impacto de meteoritos podem ter criado precursores biológicos


Novo estudo gera precursores biológicos ao simular impacto de meteoritos
portadores de carbono em oceanos da Terra jovem.


(Scientific American Brasil) Muitas teorias sobre a origem da vida na Terra sugerem que compostos pré-bióticos podem ter vindo do espaço exterior em asteróides ou cometas. Mas um novo estudo sugere que as reações químicas extremas que se iniciaram com os impactos de meteoritos podem ter dado o salto inicial para a vida nos oceanos primordiais, em vez de fornecerem tijolos para a construção da vida. Meteoritos se chocando com oceanos primordiais, afirma o autor do artigo, poderiam ter fornecido quantidades significativas de carbono, cruciais para a vida, e criaram uma espécie de panela de pressão química, pela força dos seus impactos, para sintetizar os fundamentos das moléculas biológicas.

Pesquisadores relataram na Nature Geoscience, de 1º de janeiro passado, que reproduziram o impacto de um condrito, um tipo comum de meteorito, chocando-se com o oceano a aproximadamente 2 km/s. A equipe simulou o condrito, submetendo seus constituintes químicos (ferro, níquel e carvão), além de água e nitrogênio, que se acredita ter sido abundante na atmosfera jovem da Terra, à forte compressão de um choque. As pressões e temperaturas resultantes, que provavelmente ultrapassaram 2.760°C, produziram uma grande variedade de compostos orgânicos (baseados em carbono) como ácidos graxos e aminas. E quando amônia, que um estudo anterior mostrou que pode ser produzida em impactos, foi acrescentada à mistura, a experiência também produziu glicina (um aminoácido simples).

Toshimori Sekine, co-autor do estudo, e pesquisador do Instituto Nacional de Ciência dos Materiais, em Tsukuba, Japão, revela que ficou surpreso com o resultado do experimento, acrescentando que “há muitas outras moléculas que ainda não analisamos”. O autor do estudo, Yoshihiro Furukawa, aluno de pós-graduação da Universidade Tohoku, em Sendai, no Japão, diz que em função dos resultados, “podemos afirmar que eventos de impacto no oceano foram processos muito eficientes para a produção de diversas biomoléculas na Terra jovem”. No entanto, ele imediatamente faz a ressalva de que não está claro quantas dessas biomoléculas seriam necessárias para dar início à vida.

Para garantir que os compostos orgânicos foram produzidos pelo choque da colisão simulada (e não de fontes externas), o grupo de Furukawa utilizou carbono 13, um raro isótopo de carbono, no modelo para representação do meteorito. O fato de as moléculas detectadas terem sido enriquecidas com carbono 13, em vez de carbono 12, muito mais comum, exclui a possibilidade de contaminação, observam os autores.

“É fantástico mostrar que é possível aproveitar a energia de impactos para criar ligações ou pontes orgânicas”, avalia Jennifer Blank, astrobióloga do Instituto Seti, em Mountain View, Califórnia. Mas ela teme que teorias sobre origem da vida nunca possam ir além da hipótese. “Do ponto de vista generalista, uma das frustrações evidentemente, é que nunca saberemos a resposta, mas, como um outro mecanismo que contribua para o inventário de compostos orgânicos, é legítimo”, ela comenta.

Donald Brownlee, astrônomo da University of Washington concorda, acrescentando que enquanto a maioria das teorias propõe que moléculas orgânicas vieram do espaço ou foram formadas por processos terrestres, “é interessante considerar que elas poderiam ter se formado aqui porque material está caindo do espaço”. Ao mesmo tempo, Brownlee se pergunta se um meteorito grande e suficientemente massivo para penetrar na atmosfera e se chocar com o oceano em alta velocidade poderia impedir a formação de compostos orgânicos. “Se o corpo for muito grande”, avalia ele, “os materiais gerados serão, provavelmente, destruídos pelo impacto”.

O estudo de Sekine, Furukawa e seus colegas pode ser considerado réplica do impacto cinético-oceânico do experimento Urey-Miller, uma demonstração lendária realizada em 1953 pelo falecido químico, Stanley Miller, da University of Chicago, que juntamente com o colega Harold Urey mostraram que uma descarga elétrica aplicada aos componentes que supostamente existiriam na atmosfera primordial da Terra produziu grandes quantidades de aminoácidos. Em outubro de 2008, o químico marinho Jeffrey Bada, do Instituto de Oceanografia Scripps, em La Jolla, Califórnia, e seus colegas, publicaram uma reavaliação de algumas amostras de Miller, partindo de uma configuração experimental diferente. Bada e colaboradores obtiveram ainda mais material orgânico do que Miller havia relatado ─ 22 aminoácidos e cinco aminas.

Sekine adverte que a teoria do impacto de meteoritos não está em condições de superar o consagrado experimento Urey-Miller. Os resultados do novo estudo se limitam a “abrir uma porta para discutir a possibilidade” de se interpretar impactos de meteoritos como precursores da vida na Terra. “Precisamos testar a possibilidade de formação de aminoácidos mais complicados”, ele sugere.

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