terça-feira, 12 de novembro de 2013

Depois de milênios, ameaça geológica volta a assombrar Israel


(O Globo) Um fantasma geológico que ronda a Terra Santa há milênios voltou a dar as caras. Seis terremotos de força média - com entre 3,3 e 3,6 pontos na escala Richter - foram sentidos no Norte e no Sul de Israel entre os dias 10 e 16 de outubro, levando os 7 milhões de habitantes do país a temer que um tremor mais forte seja iminente. Os tremores atingiram principalmente a área em volta do Mar da Galileia, no Norte de Israel, mas um deles abalou Eilat, na fronteira Sul do país com o Egito. Os eventos lembraram aos esquecidos que a história desse pedaço de terra é repleta de tantos abalos sísmicos quanto disputas religiosas e territoriais.

Os especialistas dizem que um grande terremoto acontece a cada 80 anos na região que hoje engloba Israel e Cisjordânia - além do Oeste da Jordânia e do Sul da Síria e do Líbano. O último tremor devastador aconteceu em 11 de julho de 1927, com 6,3 na escala Richter e epicentro em Jericó. Ao todo, 500 pessoas morreram, 130 delas só em Jerusalém, onde 300 casas desabaram. Locais sagrados como a Igreja do Santo Sepulcro (que marca o local onde, segundo a tradição cristã, Jesus foi crucificado, enterrado e depois ressuscitou), e a Mesquita de Al-Aqsa, terceiro mais importante ponto de orações para o Islã, foram danificados. O abalo de grandes proporções anterior aconteceu no dia 1º de janeiro de 1837, com 6,8 na escala Richter. Foi muito mais devastador: destruiu completamente a cidade de Safed, na Galileia, matando 5 mil pessoas.

- O próximo grande terremoto é só uma questão de tempo - diz Avi Shapiro, diretor do comitê interministerial israelense para prevenção contra terremotos.

Segundo estudos israelenses, cerca de 12 grandes terremotos causaram enormes danos em cidades da região nos últimos mil anos. No ano de 1033 D.C., por exemplo, um grande terremoto destruiu as muralhas bizantinas que envolviam a Cidade Velha de Jerusalém, colocando abaixo a Mesquita de Al-Aqsa. Jerusalém sofreu outro terremoto severo, de 6,7 na escala Richter, em 15 de janeiro de 1546, quando a Igreja do Santo Sepulcro foi destruída e o Domo da Rocha (também sagrada para muçulmanos), seriamente danificado. Mas não é preciso ir tão longe no passado: em 2004, um tremor de magnitude 5 também assustou. Em apenas 20 segundos, o abalo gerou pânico em Jerusalém e em Belém, causando pequenas fraturas em partes da Igreja da Natividade (onde, segunda a tradição cristã, Jesus nasceu), que havia passado por uma restauração duvidosa em 1999.

A Terra Santa fica no centro da chamada “falha Sírio-Africana”, uma grande fenda que se estende por 4,8 mil quilômetros da Síria até Moçambique, na África, onde duas placas tectônicas que se separaram há 35 milhões de anos volta e meia se roçam. A falha passa por baixo do Mar Vermelho, do Mar Morto, do Rio Jordão e do Mar da Galileia. Preocupados com as possíveis consequências de um tremor de terra mais contundente, as autoridades israelenses prepararam um relatório apontando cenários e soluções. Se Israel for alvo de um terremoto de 7,5 na escala Richter, 17 mil pessoas poderão morrer. As cidades mais atingidas seriam Tiberíades, Haifa, Bet Shean e Eilat. As palestinas seriam Jenin e Nablus, mas toda a região sentiria o tremor.

- Se acontecer alguma coisa desse estilo, o cenário será o de incêndios generalizados que podem se espalhar rapidamente, engarrafamentos gigantes nas estradas que não deixarão os bombeiros e as ambulâncias passarem - imagina Moshe Rivak, ex-comandante do Corpo de Bombeiros da região Norte de Israel. - Será uma catástrofe.

Apesar do histórico de terremotos, Israel não parece preparado para um grande abalo sísmico. Segundo Gadi Ofer, presidente da Associação por Melhores Moradias, 60% dos prédios e casas do país não aguentariam um terremoto forte. Desde 1980, Israel tem um estatuto que obriga arquitetos a planejarem novos edifícios que resistam a tremores. Mas nem todos seguem as diretrizes à risca. Fora isso, a grande maioria das construções anteriores à década de 1980 não foi reforçada, apesar de, em 2005, o governo ter estabelecido um plano pelo qual empreendedores recebem incentivos para reformar prédios antigos. Só 1.500 dos 96 mil prédios que precisam de reforços foram restaurados, até agora.

- Terremotos são imprevisíveis e quem diz o contrário está enganando o público - afirma o diretor geral do Instituto de Geofísica de Israel, Uri Frieslander. - Houve casos no passado em que, por exemplo, houve uma mudança no nível das águas e poços antes de um tremor. Ou que animais sentiram que algo estava para acontecer. Houve casos em que pequenos terremotos precederam um grande. O problema é que todos esses fenômenos são inconsistentes. Às vezes acontecem, mas nem sempre.

Segundo um estudo do Centro de Pesquisas Geológicas de Israel, caso um grande tremor volte a abalar Israel, os locais sagrados da Cidade Velha de Jerusalém serão alguns dos mais afetados, já que foram construídos em cima de camadas de detritos deixadas por milênios de disputas territoriais, não sobre terra sólida. Jerusalém também é repleta de labirintos subterrâneos, cisternas e túneis. O estudo sugere que as autoridades precisam urgentemente reforçar as estruturas de locais como a Igreja do Santo Sepulcro.

- As camadas embaixo da Cidade Velha não são feitas de pedra sólida, mas sim de uma espécie de cascalho. Essas fracas fundações podem aumentar a onda sísmica do terremoto - diz Amos Bein, diretor do Centro de Pesquisas Geológicas.

Outro local em perigo é a Esplanada da Mesquita, ou Monte do Templo, coração do conflito entre judeus e árabes na Terra Santa. É lá que ficam, hoje, duas das mais sagradas mesquitas para os muçulmanos (a de Al-Aqsa e o Domo da Rocha) e também o Muro das Lamentações, lugar mais importante para o Judaísmo e onde, há dois mil anos, ficava o Templo de Herodes e, antes dele, o Templo de Salomão.

Estudiosos da Bíblia acreditam que terremotos estão por trás de alguns dos principais relatos do livro sagrado, entre eles a destruição de Sodoma e Gomorra (que ficavam justamente em cima da falha Sírio-Africana, às margens do Mar Morto) por volta de 1900 a.c, e a queda das muralhas de Jericó, poucos quilômetros ao Norte, por volta de 1400 a.c. Em 31 a.c., outro grande tremor foi sentido na área de Qumran, adjacente ao Mar Morto, causando a morte de 10 mil pessoas, segundo escreveu o historiador Flávio Josefo. No Novo Testamento, também há o relato de pelo menos mais dois tremores: um no dia crucificação de Jesus e outro no da ressurreição. Pesquisadores sabem que houve um grande tremor em 11 de abril de 32 d.c., que pode ter marcado, então, a data da crucificação.

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