quarta-feira, 14 de julho de 2010

Estudo indica que mudanças climáticas provocadas pelo homem começaram há cerca de 15 mil anos

(Correio Braziliense) A influência negativa da humanidade sobre o clima do planeta pode ter começado bem antes do que o imaginado. Mais especificamente, 15 mil anos atrás, durante a pré-história. Um estudo publicado no jornal da União Americana de Geofísica mostrou que, mesmo infinitamente longe do período industrial, que só aconteceria centenas de séculos depois, o homem das cavernas já desequilibrava o ambiente a ponto de fazer subir a temperatura da Terra.

A tese desenvolvida por uma equipe de cientistas da Universidade de Stanford, na Califórnia, sustenta que tudo começou quando os caçadores humanos saíram da África e se espalharam pelo Hemisfério Norte. Até então, na área, ocupada hoje por países como Canadá, Rússia e Estados Unidos (parte norte e Alasca), era o paraíso dos grandes mamíferos. Quem assistiu ao filme Era do gelo tem uma ideia de como era a paisagem: uma superfície coberta de neve, por onde passavam mamutes, tigres-de-bengala, leões-americanos e panteras-gigantes.

Nos períodos entre uma glaciação e outra, a neve dava lugar a florestas ou savanas. Na zona boreal, predominavam extensos gramados, que serviam de pasto para herbívoros como o mamute. Com a chegada do homem, a concorrência pela presa tornou-se, de certa forma, desleal. Os animais podiam ser grandes e fortes, mas não tinham algo que o Homo sapiens dominava: as armas. Com seus arcos e lanças, os caçadores levavam vantagem, e os outros predadores precisavam diversificar o cardápio. Os mamutes não demoraram a virar alvo. A extinção desses animais pode ser atribuída, principalmente, à migração do homem para o norte. O que os cientistas da Universidade de Stanford apresentaram de novidade é que a morte dos mamutes está relacionada ao aumento da temperatura global.

Esses herbívoros se alimentavam de bétulas. As árvores não conseguiam crescer pois, além de devorar os arbustos antes que evoluíssem para troncos, os mamutes comiam as sementes. Livres de seu maior predador, as bétulas começaram a crescer e a se espalhar, modificando a paisagem. Ao contrário do que ocorre nas zonas tropicais, onde o solo úmido ajuda na formação de nuvens que bloqueiam a radiação, no Hemisfério Norte, as árvores transpiram pouco, mas continuam a absorver o calor. Dessa forma, a superfície da Terra se torna mais quente (veja arte).

“Uma escavação de uma área do Paleolítico na Sibéria mostrou que no local havia ferramentas e uma vasta quantidade de ossos do Pleistoceno (época geológica), especialmente de mamutes. Isso indica que a caça dessa megafauna era feita pelos humanos. Na Eurásia (quando a Ásia estava ligada geograficamente à Europa), muitas espécies adaptadas ao frio, incluindo os mamutes, foram extintas durante o período de crescimento da população dos Homo sapiens”, explicou ao Correio o principal autor do estudo, Christopher Doughty.

“A evidência de que os humanos tiveram papel importante na extinção dos mamutes é mais forte do que para qualquer outro animal do Pleistoceno”, acrescentou. De acordo com ele, nesse período, houve uma “drástica mudança na vegetação do Alasca e do leste americano, à medida que a megafauna era extinta”. Segundo Doughty, no passado, era difícil determinar se a vegetação mudou antes ou após a morte dos grandes mamíferos do Pleistoceno, devido à raridade de fósseis.

Apesar disso, a natureza deixou pistas. O pesquisador conta que fungo antigo, a sporormiella, acompanhou o declínio da megafauna: “As esporas eram abundantes nos sedimentos do início da era glacial, mas raras no Holoceno (posterior ao Pleistoceno). Um estudo recente usou as esporas fossilizadas do fungo para mostrar que a mudança na vegetação foi precedida da extinção dos mamíferos na América do Norte”, diz Doughty.

O pesquisador afirma que a megafauna desempenhou um papel fundamental na manutenção dos grandes pastos, no lugar da expansão das árvores nas savanas.

Simulador
A equipe usou um simulador de clima para estimar que a expansão das bétulas gerou, ao longo de séculos, um aumento na temperatura mundial de 0,1ºC. “Especificamente na Sibéria, podemos afirmar que cerca de 0,2ºC de aquecimento foi causado por ação humana”, afirma Doughty.

O aumento pode parecer pouco. Nos últimos 150 anos, a temperatura subiu seis vezes mais, principalmente devido à emissão de gases de efeito estufa. Mas o estudo, de acordo com o pesquisador, serve como alerta: “Muitas pessoas ainda pensam, hoje, com uma população de 6 bilhões de pessoas, que o ser humano não é capaz de afetar o clima. Os resultados, porém, mostram que mesmo quando tínhamos uma população de magnitude muito menor do que agora, éramos capazes de provocar um grande impacto”.

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