sábado, 29 de maio de 2010

Cientistas estudam envolvimento de bactérias na ocorrência de neve e chuva

(The New York Times / UOL) Caminhando pelo campus da Universidade Estadual de Montana, David Sands, patologista vegetal, disse que a manta de neve sobre as montanhas que cercam a cidade trazia uma surpresa.

A causa da maioria da neve, segundo ele, é um organismo vivo, uma bactéria chamada Pseudomonas syringae.

Nos últimos anos, Sands e outros pesquisadores acumularam evidências de que o grupo de bactérias, conhecido há tempos por viver em plantações de agricultura, é muito mais disseminado do que se imaginava, e podem fazer parte de um ecossistema climático pouco estudado. O princípio é bem aceito, mas o grau de disseminação do fenômeno continua sendo motivo de debate.

O modelo aceito de precipitação diz que fuligem, poeira e outros compostos inertes formam os núcleos de gotas de chuva e flocos de neve. Cientistas encontraram uma abundância dessas bactérias nas folhas de uma ampla variedade de plantas domésticas e selvagens, incluindo árvores e pastos, em todos os locais onde procuraram – incluindo em Montana, Marrocos, França, Yukon e no gelo enterrado da Antártida. As bactérias foram encontradas em nuvens, rios e canais de irrigação. Em um estudo com diversos picos de montanhas locais, 70% dos cristais de neve examinados haviam se formado ao redor de um núcleo bacteriano.

Algumas das bactérias promovem o congelamento como forma de atacar plantas. Elas produzem proteínas que desencadeiam o congelamento em temperaturas mais altas do que o normal, e o gelo de água resultante danifica as plantas, permitindo que a bactéria tenha acesso aos nutrientes necessários.

Essa habilidade de promover o congelamento da água em temperaturas mais altas levou Sands e outros cientistas a acreditar que as bactérias fazem parte de um sistema não estudado. Depois que as bactérias infectam plantas e se multiplicam, diz ele, elas podem ser lançadas no céu como aerossóis, onde parecem estimular a formação de cristais de gelo (que derretem à medida que caem na terra, causando chuva) a temperaturas mais altas do que as partículas de poeira ou minerais que também funcionam como núcleo de cristais de gelo.

“A chuva é um mecanismo que ajuda essas coisas a se moverem”, disse Cindy Morris, patologista vegetal do Instituto Nacional Francês de Pesquisa Agrícola, que está estudando as bactérias.

A habilidade que essa proteína dentro da bactéria possui para fazer chuva é bem conhecida. Áreas de esqui usam um canhão para lançá-la ao ar, com água, para fazer neve, e ela também é usada em esforços de semeação de nuvens para criar chuva. Uma única bactéria, pequena demais para ser vista a olho nu, pode produzir moléculas de proteína suficientes para mil cristais de neve.

Os pesquisadores acreditam na existência de outros fungos e bactérias que fazem a mesma coisa.

Roy Rasmussen, físico de nuvens do Centro Nacional de Pesquisa Atmosférica dos Estados Unidos, diz que a pesquisa, conduzida principalmente por patologistas vegetais, renovou o estudo das bactérias como causa de chuva por físicos atmosféricos. Algumas grandes perguntas permanecem, entretanto.

“É uma teoria sólida”, afirmou Rasmussen. “A questão é: essas bactérias chegam à atmosfera em concentrações grandes o bastante para surtir algum efeito? Minha intuição diz que isso pode ser importante para lugares e épocas específicas, mas que não é global. Isso não é algo que tenhamos deixado passar”.

Russ Schnell, cientista atmosférico da Administração Oceânica e Atmosférica Nacional dos Estados Unidos, foi o primeiro a propor a importância das bactérias na formação de cristais de gelo em nuvens, junto a um colega, Gabor Vali, num artigo de 1970 da revista “Nature”. “Mas nós não tínhamos as técnicas para fazer mais”, explicou Schnell. “As ferramentas de hoje são incrivelmente melhores do que quando estávamos fazendo esse estudo. Isso é algo muito bonito de ver”.

O interesse nas bactérias cresceu graças a publicações recentes e a dois encontros internacionais sobre o assunto. Morris estima que cerca de 30 cientistas no mundo todo estejam pesquisando o papel das bactérias na precipitação.

Se Sands estiver correto sobre a importância das bactérias, haverá implicações para a destruição da vegetação através do excesso de pasto e do desmatamento, que podem reduzir a presença das bactérias e contribuir para secas. Por outro lado, como as bactérias prosperam em algumas plantas e são escassas em outras, plantar a vegetação correta poderia acentuar as chuvas. “Trigo e cevada podem gerar diferenças de milhares” no número de bactérias, segundo Sands, “dependendo da variedade”.

A pesquisa continua. Na Inglaterra, cientistas estão voando através de nuvens para coletar amostras de água de nuvem, e analisando o DNA de micróbios dentro dela. Pesquisadores da Virginia Tech sequenciaram o DNA de 126 subgrupos da bactéria, para criar um banco de dados que permitiria aos cientistas rastrear as bactérias até suas origens geográficas.

“Esse é um sistema complicado”, disse Brent C. Christner, professor-assistente na Universidade Estadual de Louisiana, que estuda ecologia microbiana em gelo glacial e encontrou as bactérias na Antártida. “Não se pode trazê-las ao laboratório para enumerá-las e estudá-las”.

A pesquisa poderia ter implicações para a mudança climática. Sands disse que as bactérias não crescem em temperaturas acima dos 30 graus. Se as temperaturas ficarem quentes por tempo demais, segundo ele, elas poderiam morrer. “Há mais trabalho a ser feito”, disse Sands. “Temos um cenário bem complicado”.

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